segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Amigos ?

( escrito a 15.10.2007 no blog original )






Conhecer alguém. Ele sucumbe a uma pseudo-paixoneta , ela nem por isso. Vistas as coisas decidem que podem ser amigos e encontram-se várias vezes, fazem coisas de amigos como jantar fora, ir ao cinema ou a um concerto . A coisa vai andando controlada mas a ideia sempre presente de uma atracção por parte dele faz com que ela tenha momentos de recuo ou de avanço, conforme acha que lhe está a dar esperanças ou não.

A situação dela é delicada e tem de ser bem gerida porque tem ali uma pessoa que - não fazendo tudo por ela - faria muita coisa, e isso causa uma sensação inebriante .

Note-se que a situação ficou esclarecida ao ínicio mas resta sempre uma réstia de esperança que as coisas se invertam ou sejam geradas sinergias que levem a uma maior intimidade e eventualmente um relacionamento. Com o tempo, e quando tal não acontece, há um distanciamento - da parte dele.

Ela?

Ela fica sempre a pensar que afinal tanta atenção, tanto interesse e amizade daquele "amigo" traziam água no bico e eram apenas um meio para obter um fim, um prémio : ela - com tudo o que isso implica - ou sexo, o que acontecer primeiro.

Esta estória podia ser contada na 1ª pessoa, e já o foi algumas vezes. Num Mundo em que toda a gente corre, num Mundo em que os relacionamentos são tipo fast-food , num Mundo em que a amizade passou a ter um papel secundário, é muito difícil ter amigas porque essas também correm atrás da sua cara-metade, e impossível ter amigos. Porque esses também não têem tempo a perder.

Mia Couto : a fábula do macaco e do peixe


Um macaco passeava-se à beira de um rio, quando viu um peixe dentro de água. Como não conhecia aquele animal, pensou que estava a afogar-se. Conseguiu apanhá-lo e ficou muito contente quando o viu aos pulos, preso nos seus dedos, achando que aqueles saltos eram sinais de uma grande alegria por ter sido salvo. Pouco depois, quando o peixe parou de se mexer e o macaco percebeu que estava morto, comentou:
- Que pena eu não ter chegado mais cedo!

Gloria


o valioso tempo dos homens maduros , Mário de Andrade


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar
da idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral.
'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...
Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!